Integração
Empreendimento imobiliário ameaça restinga de Maricá
As políticas públicas voltadas ao turismo têm atraído muitos investimentos e colaborado para o desenvolvimento social e econômico de Maricá, localizada a 60 quilômetros da capital fluminense. No entanto, muitas delas privilegiam desproporcionalmente interesses privados e ganhos econômicos que se sobrepõem às preocupações socioambientais. Como afirma a membro do Subcomitê Maricá-Guarapina, Flávia Lanari, essa lógica vem sendo observada em relação à instalação de um complexo turístico-residencial, com capacidade para cerca de 40 mil pessoas, no mínimo, entre moradores, turistas e prestadores de serviço, na Área de Preservação Ambiental (APA) de Maricá, entre o mar e a lagoa. A APA Maricá é formada pela restinga, pela Ilha Cardosa e pela Ponta do Fundão, cada uma delas com um proprietário diferente.
Na restinga, a área compreende trechos de vegetação típica: cactos, bromélias, espécies diversas de gramíneas e arbustos de baixo porte. Aproximando-se do mar, a vegetação fica caracterizada por cordões arenosos cobertos por dunas ainda bastante preservadas, que representam marcos geológicos de até 7 mil anos. Seu sistema de praias tem como função proteger os corpos hídricos, minimizando a erosão e a sedimentação, especialmente quando afetem ou possam afetar atividades que dependam da utilização da água ou do solo, além de colaborar com a manutenção dos ciclos biogeoquímicos fundamentais à conservação ambiental.
Flávia Lanari explica que o sistema lagunar de Maricá é composto por cinco lagoas, que recebem toda a carga de esgoto do município. “A maioria da população ainda se abastece com água de poço, apenas quem tem condições compra água mineral. Além de todo o impacto da obra, que vai ocupar bem mais de 6% da restinga de uma APA fundamental à conservação dos recursos hídricos, a ocupação do complexo levará ao aumento do consumo da água e da geração do volume de efluentes.”
O projeto do complexo tem 840 hectares (o equivalente a 840 campos de futebol oficial), e prevê a construção de um grande campo de golfe, centro hípico, quatro hotéis, um resort, dois shoppings, dois clubes, prédios de quatro andares, restaurantes, escola, hospital e casas residenciais. O arruamento já começou a ser realizado e a avaliação é de que o empreendimento coloca em risco espécies endêmicas, aves migratórias, dunas raras, sítios históricos e arqueológicos, além do sustento de cerca de 200 famílias do povoado pesqueiro de Zacarias, que dependem do sistema lagunar para garantir sua subsistência.
“Considerando todas as estruturas do projeto, a restinga de Maricá será praticamente extinta”, diz Flávia. Segundo ela, originalmente, o litoral do município era inteiramente margeado pela vegetação, mas, hoje, grande parte dos bairros se localizam nessas áreas, sendo a APA um pequeno fragmento do que ainda resta da restinga.
Datado em 1984, o decreto da criação da APA de Maricá proíbe o parcelamento de terras para fins urbanos e a construção de edificações no local. No entanto, a área permaneceu nas mãos de particulares. Ao longo dos anos, sua posse foi transferida entre diversas empresas, até ser adquirida pela Madri Lisboa/IDB do Brasil, em 2006. Desde então, o acesso à restinga tem sido controlado por uma empresa privada de segurança, que a cercou e instalou guaritas nos três únicos pontos de acesso. Uma novidade no caso é que no dia 26 de maio o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu liminar de suspensão das obras do empreendimento e de qualquer intervenção na APA de Maricá.
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